CRIANÇAS E A TERRA – RETORNO A NÓS MESMOS

No trabalho de Educação Ambiental, uma das atividades que realizamos é a de disponibilizar materiais naturais para as crianças manipularem: galhos, folhas, frutos, água e… …terra. Então, neste momento específico, verificamos uma experiência digna de uma análise mais profunda. Algo diferente acontece quando disponibilizamos terra para as crianças realizarem suas brincadeiras. Alguma coisa que, claramente, transcende a simples percepção do que está acontecendo. Crianças e a terra geram uma conexão única e profunda. Toda a dispersão costuma se transformar em concentração, levando embora consigo a agitação. Ousaríamos dizer que o contato com a terra parece evocar uma relação antiga e importante. Quase como se fosse… …um retorno. Uma lembrança que, de volta, preenche nossas percepções, nossos sentidos, nos traz o que, de fato, somos. Mas, o que é isso? Ou o que somos e de onde viemos? E porque isso seria importante neste contexto?

TERRA E NÓS

Terra é também o nome do planeta onde vivemos. E esta não é uma denominação ao acaso. Apesar de 70% da superfície do planeta ser coberta por água, embaixo desta há os mesmos elementos componentes que são fundamentais para o chão que nos é tão precioso. A Terra é um corpo celeste rochoso. Seu nome não poderia ser mais adequado deste ponto de vista. Nossa identidade cósmica é composta principalmente por terra. Por conta disso tudo, somos terráqueos. Até mesmo a afirmação bíblica que viemos do barro não está longe de uma realidade quando pensamos nesta direção.


Mais que isso. A terra também nos presenteia com a maioria absoluta dos alimentos que necessitamos para viver. Não apenas alimento, mas vestes, utensílios, ferramentas. As águas fluviais surgem da terra para saciar nossa sede. A terra nos dá praticamente tudo que precisamos. São muitas as tradições e religiões antigas que, ao intuírem ou perceberem mais empiricamente isso, tem rituais de agradecimento à terra. Esta relação de troca está inserida profundamente em nossas identidades culturais, religiosas, sociais (na verdade, o Agro, não o agronegócio, mas a agricultura, é pop mesmo) e individuais. Sim, individuais. Pois não importa quanto cimento botemos por cima, é da terra que nasceremos, aprenderemos a dar os primeiros passos e todo o resto. E, um dia, retornaremos aos seus braços. Pelo menos nossa parte física.

RETORNO A NÓS MESMOS

Por isso, e outras razões, acreditamos que manusear terra traz várias reminiscências afetivas e originárias. Memórias que remetem a todas as nossas identidades individuais e coletivas, enquanto indivíduos, humanidade, animais, seres viventes e terráqueos. Hoje em dia, começa a se falar sobre “déficit de natureza”, com a percepção de que o isolamento dos ambientes naturais tem prejudicado o ser humano emocionalmente, psicologicamente e animicamente. Talvez seja isso que sentimos ao mexer na terra: falta de Natureza. De um modo geral. E de maneira específica: saudade de nós mesmos. Do que somos. Do que nos preenche e nos alimenta. Do que é nosso endereço, nossa casa… Do que somos.

Observar as crianças brincando com a terra costuma nos lembrar de que, de todos os nomes que costumamos lhe outorgar, há um que sempre retorna com força, mesmo que alguns considerem piegas e outros rotulem como exagero sentimentalista. Este nome sempre volta, pois é nossa referência coletiva de origem, de casa, de segurança. De tempos em tempos, a chamamos carinhosamente de Mãe Terra.